valter hugo mãe
poeta, romancista, artista plástico e cantor nasceu em 25 de setembro de 1971 em Angola. Vencedor do Prêmio Literário José Saramago em 2007, foi saudado pelo grande escritor como “uma revolução”, um verdadeiro “tsunami literário”.
Como poeta, publicou "contabilidade “silencioso corpo de fuga”; “o sol pôs-se calmo sem me acordar”; “entorno a casa sobre a cabeça”; é autor dos romances: “o nosso reino”; “o remorso de baltazar serapião”; “o apocalipse dos trabalhadores”, “a máquina de fazer espanhóis” ...
Mais informações: www.valterhugomae.com
brincávamos a cair nos braços um do outro
brincávamos a cair nos
braços um do outro, como faziam
as actrizes nos filmes com o marlon
brando, e depois suspirávamos e ríamos
sem saber que habituávamos o coração à
dor. queríamos o amor um pelo outro
sem hesitações, como se a desgraça nos
servisse bem e, a ver filmes, achávamos que
o peito era todo em movimento e não
sabíamos que a vida podia parar um
dia. eu ainda te disse que me doíam os
braços e que, mesmo sendo o rapaz, o
cansaço chegava e instalava-se no meu
poço de medo. tu rias e caías uma e outra
vez à espera de acreditares apenas no que
fosse mais imediato, quando os filmes acabavam,
quando percebíamos que o mundo era
feito de distância e tanto tempo vazio, tu
ficavas muito feminina e abandonada e eu
sofria mais ainda com isso. estavas tão
diferente de mim como se já tivesses
partido e eu fosse apenas um local esquecido
sem significado maior no teu caminho. tu
dizias que se morrêssemos juntos
entraríamos juntos no paraíso e querias
culpar-me por ser triste de outro modo, um
modo mais perene, lento, covarde. Eu
amava-te e julgava bem que amar era
afeiçoar o corpo ao perigo. Caía eu
nos teus braços, fazias um
bigode no teu rosto como se fosses o
marlon brando. eu, que te descobria como se
descobrem fantasias no inferno, não
queria ser beijado pelo marlon brando e
entrava numa combustão modesta que, às
batidas do meu coração, iluminava o meu
rosto como lâmpada falhando
a minha mãe dizia-me, valter tem cuidado, não
brinques assim, vais partir uma perna, vais
partir a cabeça, vais partir o
coração. e estava certa, foi tudo verdade
Poema do livro 'contabilidade', poesia recolhida 1996-2010, Alfaguara, 2010.
Adriana Calcanhotto
Em 2008, Adriana lançou seu primeiro livro, Saga Lusa. O livro é um relato da viagem a Portugal em sua turnê do disco Maré. A escrita torna-se a única atividade que Adriana, sentada em frente ao seu computador realiza e com muito bom - humor. O livro está repleto de passagens engraçadas nos momentos de delírio, onde a própria escritora ri de si mesma.
O livro foi lançado pela Editora Cobogó (Brasil) e por Quasi Edições (Portugal).
Medo de Amar
Você diz que eu te assusto
Você diz que eu te desvio
Também diz que eu sou um bruto
E me chama de vadio
Você diz que eu te desprezo
Que eu me comporto muito mal
Também diz que eu nunca rezo
Ainda me chama de animal
Você não tem medo de mim
Você não tem medo de mim
Você tem medo é do amor
Que você guarda para mim
Você não tem medo de mim
Você não tem medo de mim
Você tem medo de você
Você tem medo de querer...
Você diz que eu sou demente
Que eu não tenho salvação
Você diz que eu simplesmente
Sou carente de razão
Você diz que eu te envergonho
Também diz que eu sou cruel
Que no teatro do teu sonho
Para mim não tem papel
Você não tem medo de mim
Você não tem medo de mim
Você tem medo é do amor
Que você guarda para mim
Você não tem medo de mim
Você não tem medo de mim
Você tem medo de você
Você tem medo de querer...
...me amar!
José Carlos Ary dos Santos
Soneto de Mal Amar
Invento-te recordo-te distorço
a tua imagem mal e bem amada
sou apenas a forja em que me forço
a fazer das palavras tudo ou nada.
A palavra desejo incendiada
lambendo a trave mestra do teu corpo
a palavra ciúme atormentada
a provar-me que ainda não estou morto.
E as coisas que eu não disse? Que não digo:
Meu terraço de ausência meu castigo
meu pântano de rosas afogadas.
Por ti me reconheço e contradigo
chão das palavras mágoa joio e trigo
apenas por ternura levedadas.
Ary dos Santos , in O Sangue das Palavras.
lambendo a trave mestra do teu corpo
a palavra ciúme atormentada
a provar-me que ainda não estou morto.
E as coisas que eu não disse? Que não digo:
Meu terraço de ausência meu castigo
meu pântano de rosas afogadas.
Por ti me reconheço e contradigo
chão das palavras mágoa joio e trigo
apenas por ternura levedadas.
Ary dos Santos , in O Sangue das Palavras.
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